O treinamento de força é uma modalidade esportiva que vem há anos
ganhando inúmeros adeptos. Desde os anos 40 do século XX, já se
utilizavam os exercícios com pesos para otimizar o rendimento nas
diversas modalidades esportivas. Surge então neste período o termo
halterofilismo que se torna uma prática regulamentada, que consistia no
levantamento com pesos (MEC, 1966). Assim, foi criado na década de 40 o
culturismo moderno, cujo autor foi o canadense Josef Weider.
Atualmente
a maioria das pessoas que procuram uma academia visam prioritariamente
os efeitos estéticos que o treinamento proporciona, sendo o mais
buscado, a hipertrofia muscular, utilizando até mesmo de meios extremos,
como esteroides anabolizantes e/ou recursos ergogênicos nocivos à saúde
para tal.
Para um bom rendimento físico, existem diversos métodos
de treinamento que objetivam ganhos de massa muscular de forma
satisfatória. Muitos desses, até hoje, são empregados de forma
descontrolada ou empírica por profissionais da área de treinamento de
força, ou seja, sem controle e embasamento científico para seu correto
uso, o que, na maioria dos casos, além de não promoverem os ganhos
objetivados, resultam em perdas significativas de massa muscular, altos
níveis se estresse metabólico e até mesmo lesões graves que afastam
durante muito tempo o sujeito dos treinamentos.
A maioria dos
métodos de treinamento resistido foi originalmente criada por
treinadores de força, levantadores de pesos, levantadores olímpicos de
potência ou culturistas. Estes foram criados de forma empírica, sem uma
comprovação científica, mas porque praticantes experientes acreditam que
eles funcionam para produzirem resultados significantes nos ganhos de
força e hipertrofia muscular (Fleck e Kraemer, 1999; Fleck e Kraemer,
2006).
Como profissional da área e treinador de atletas, pude
vivenciar diversas vezes profissionais aplicando de forma incorreta
diversos protocolos de treinamento em seus alunos, visando somente uma
hipertrofia aguda (momentânea), fazendo uso de cargas excessivas,
movimentos incorretos, drop-sets, super-sets sem controle e até mesmo
trabalhos complexos, somente para proporcionarem a seus clientes aquele
“inchaço” no final dos treinos. Lembro que para conseguirmos alcançar um
bom resultado em longo prazo, de forma mais estável (crônico), devemos
respeitar uma progressão técnica e física, além de boa alimentação e
descanso, que certamente equilibrados resultarão em um corpo saudável e
simétrico, com excelente qualidade e estabilidade muscular.
Nos
dias 07. 08 e 09 de setembro deste ano (2012) participei do Simpósio
Internacional de Hipertrofia Muscular, onde pude ter a felicidade e
honra de conhecer um dos grandes pesquisadores sesta área na Europa, o
Prof. Dr. José Vilaça Alves (UTAD-PT), que apresentou alguns estudos
realizados em seu laboratório e de outros de autores renomados como
Steven Fleck e William J. Kraemer (USA), onde foram investigadas as
respostas de diversos métodos de treinamento para hipertrofia e também o
uso da periodização linear e ondulatória para esses fins.
Tais
trabalhos mostraram um resultado em comum: Para um bom trabalho de
hipertrofia muscular, uma correta periodização, a carga certa para cada
momento e a correta execução dos exercícios, com ampla abordagem
biomecânica, resultou em grandes respostas musculares, não somente nos
níveis de força total, mas também nos níveis hipertróficos crônicos, ou
seja, estáveis de longo prazo.
Portanto, neste artigo abordarei
alguns pontos de forma prática e resumida sobre como o periodicidade e´um bom
treinamento para hipertrofia, os métodos de treinamento mais utilizados e
algumas considerações sobre a execução de exercícios mais eficientes.
Periodização do Treinamento
Vários
pesquisadores renomados como William Kraemer e Yuri Verkhoshansky já
demonstraram em seus estudos a eficiência da periodização do treinamento
de força para fins desportivos. A hipertrofia é uma alteração
morfológica e não uma capacidade física. Segundo Gentil (2005), no caso
do treinamento de hipertrofia, a periodização serviria para definir
critérios técnicos de controle, pois até então não havia nenhum.
Existem
vários tipos de periodização, sendo uma das mais utilizadas o modelo
Clássico proposto por Matveev (1965). Na periodização Clássica,
utilizamos um macrociclo de treinamento que pode ser montado na forma de
12, 06 ou 04 meses (anual, semestral ou quadrimestral). Neste tipo de
periodização, as fases de treinamento podem ser divididas em: Fase
Básica (Preparação de Base), Específica (Aplicação Técnica –
Sobrecargas) e Competitiva (Peak), com suas peculiaridades descritas a
seguir.
FASE BÁSICA: Predomina o volume sobre a
intensidade; Adaptação articular, muscular e tendinosa ao treino.
Adaptação cardiorrespiratória ao treino.
Variáveis do Treino: 8
semanas de Duração; 8 exercícios por Treino; Uma carga em torno dos 60%
de 1 RM; Exercícios Pluriarticulares; 8 a 12 repetições por série; 2
séries nas primeiras 2 semanas e 3 nas 6 seguintes; 1’30 de descanso
entre séries; 24h de intervalo entre treinos. (Alves, J.V. 2012);
FASE ESPECÍFICA:
Predomina a intensidade sobre o volume; Melhorar a coordenação inter e
intramuscular; Estimular fibras do tipo II; Aumentar a capacidade de
recrutamento de unidades motoras do tipo II.
Variáveis do Treino:
8 semanas de Duração; 8 exercícios por Treino; Uma carga em torno dos
80% de 1 RM; Exercícios Pluriarticulares; 6 a 8 repetições por série; 3
séries por exercício; 2 a 2’30 minutos de descanso entre os exercícios;
72h de intervalo entre treinos. (Alves, J.V. 2012).
FASE DE PEAK: Melhor apresentação muscular; Hipertrofia Máxima.
Variáveis do Treino:
12 semanas de Duração; Até 12 séries por grupo muscular; Uma carga em
torno dos 75 e 85% de 1 RM; Exercícios Pluriarticulares e
monoarticulares; 6 a 12 repetições por série; 3 ou mais séries por
exercício; 72h de intervalo entre treinos. (Alves, J.V. 2012).
O
macrociclo de treinamento é subdividido em mesociclos (Atividades
realizadas em um mês de treino, com o objetivo de solucionar as tarefas
de um dado macrociclo) e em microciclos (Semana do treino, representa o
elemento da estrutura de preparação que inclui uma série de sessões de
treino respeitando as tarefas do mesociclo), onde os volumes e
intensidades de treinamento devem ser cuidadosamente calculados para um
ótimo efeito fisiológico neuromuscular.
Os mesociclos (meses) são
classificados como: INCORPORAÇÃO, BÁSICO, ESTABILIZADOR, CONTROLE,
PRÉ-COMPETITIVO (PRÉ-PEAK), COMPETITIVO (PEAK) E RECUPERATIVO.
Os microciclos (semanas) são classificados como: INCORPORAÇÃO, ORDINÁRIO, CHOQUE e RECUPERATIVO.
Exemplos de Microciclos:
Mesociclos e Microciclos
Após
termos uma noção de como são subdivididos os mesociclos e os
microciclos, surge a questão: Como aplica-los em um treinamento de
força?
Sabendo dos valores de volume e intensidade a serem
aplicados em cada fase, devemos então confeccionar os programas de
treinamento, lembrando que, neste caso específico (Treinamento de
Força), os volumes podem ser representados pelo número de séries /
exercícios e a as intensidades pela carga / tempo de recuperação /
velocidade utilizadas.
Como atuo na área de preparação física
desportiva e também como personal trainer na área de estética e terceira
idade, uma das coisas que mais demandava tempo nas minhas atividades
era a elaboração de programas de treinamento periodizado para salas de
musculação, pois além de ter que encaixar bem os mesociclos de acordo
com cada cliente, ainda surgia o problema das zonas de treinamento
(repetições por exercício), pois a literatura científica não apresenta
valores concretos sobre este assunto. Após analisar alguns estudos de
autores renomados na área de treinamento de força, desenvolvi um
software para planejamento de treinamentos periodizados por zona de
intensidade, que me gera mesociclos compostos por 5 semanas de
treinamento, onde consegui equalizar bem as zonas de repetições por
carga, que proporcionam um excelente controle dos treinamentos dos meus
clientes / atletas, conforme os exemplos a seguir:
Fase 1 – Mesociclo de Incorporação (Intensidades x Repetições / Microciclo – Semana):
Fase 2 – Mesociclo Básico (Intensidades x Repetições / Microciclo – Semana):
Fase 3 – Mesociclo Estabilizador (Intensidades x Repetições / Microciclo – Semana):
Fase 4 – Mesociclo Controle (Intensidades x Repetições / Microciclo – Semana):
Fase 5 – Mesociclo Pré-Peak (Intensidades x Repetições / Microciclo – Semana):
Fase 6 – Mesociclo Peak (Intensidades x Repetições / Microciclo – Semana):
Fase 7 – Mesociclo Recuperativo (Intensidades x Repetições / Microciclo – Semana):
Estes
mesociclos podem ser repetidos de acordo com o período do treinamento
que o sujeito encontra-se, lembrando que para tal, todo o trabalho deve
estar planejado dentro do macrociclo.
Com os valores das cargas,
os volumes e os exercícios bem planejados, podemos então utilizar
diversos métodos de treinamento para proporcionar a musculatura sempre
uma nova adaptação, quebrando a homeostase (estabilização fisiológica),
promovendo maior recrutamento de unidades motoras e maior destruição de
fibras (micro lesões), gerando assim excelentes respostas nos níveis
hipertróficos musculares, lógico, acompanhados de uma boa nutrição e
períodos controlados de descanso.
Métodos de Treinamento Para Hipertrofia
No
treinamento de força existem diversos métodos de treinamento que
objetivam a hipertrofia máxima. Esses métodos como qualquer treinamento,
devem ser bem planejados dentro dos mesociclos em cada fase específica
para tal, por exemplo, se em um momento objetiva-se desenvolver a
resistência muscular específica, utilizaremos, por exemplo, exercícios
que utilizem médios-grandes-grandes volumes com intensidades
médias-baixas e não exercícios intensos com volume baixo que
necessitarão recrutar com mais ênfase tipos de fibras rápidas e não as
lentas objetivadas na fase em questão.
Para aplicarmos
corretamente alguns métodos de treinamento para hipertrofia, devemos
lembrar que para conseguirmos grandes resultados, os exercícios devem
proporcionar TENSÃO MECANICA; “LESÃO” MUSCULAR e ESTRESSE METABÓLICO,
que atingirão de forma satisfatória as fibras tipo I, IIa, IIb e IIx.
Para tais, utilizaremos métodos específicos que, devidamente aplicados,
além de promoverem altos ganhos de força e resistência, resultarão em
músculos bem desenvolvidos e simétricos.
EXEMPLOS DE MÉTODOS DE TREINAMENTO PARA HIPERTROFIA:
1. SÉRIE SIMPLES: execução de cada exercício proposto em uma série somente. (Fleck, S. J. 1999);
2. SÉRIE MÚLTIPLA: consiste em 2 ou 3 séries de aquecimento com carga crescente, seguido por várias séries de igual carga. (Fleck, S. J. 1999);
3. TREINAMENTO PROGRESSIVO:
Adição de cargas progressivas periodicamente, aumento de nº de séries e
sessões de treino e diminuir as pausas entre as séries. (Guimarães, W.
1997);
4. PIRÂMIDE CRESCENTE: das cargas, das repetições em cada série. (Guedes, D. 1997);
5. PIRÂMIDE DECRESCENTE: das cargas, das repetições em cada série. (Guedes, D. 1997);
6. ISOLADO: consiste em isolar o músculo da ação dos músculos auxiliares. (Guimarães, W. 1997);
7. REPETIÇÕES NEGATIVAS: usar cargas acima de 100% dando ênfase ao trabalho excêntrico do movimento. (Guedes, D. 1997);
8. REPETIÇÕES FORÇADAS:
usar cargas entre 80 e 100% e ao final de uma série, fazer mais 2 ou 3
repetições com ajuda de 1 companheiro na fase concêntrica. (Guedes, D.
1997);
9. REPETIÇÕES ROUBADAS: idem acima, sem ajuda do companheiro, sacrificar a postura correta para a realização dessas repetições. (Guedes, D. 1997);
10. CONFUSÃO MENTAL:
consiste em variar constantemente o exercício, a série, repetições e
ângulos, para que não ocorra a homeostase. (Guedes, D. 1997);
11. PRÉ EXAUSTÃO:
consiste em executar um exercício uni-articular, para que o músculo em
questão sofra uma exaustão parcial e em seguida executar um exercício
bi-articular onde o músculo é auxiliado por um sinergista. (Guedes, D.
1997);
12. EXAUSTÃO: executar tantas repetições possíveis com uma determinada carga, até a falha concêntrica momentânea. (Fleck, S. J. 1999);
13. PRIORITÁRIO:
iniciar o treino pelo músculo ou segmento corpóreo mais fraco ou aquele
segmento que precisa de um maior desenvolvimento. (Guimarães, W. 1997);
14. SUPER-SÉRIE:
trabalha-se os músculos agonistas e antagonistas entre sí, em uma mesma
série, sem ou muito pouco intervalo. (Fleck, S. J. 1999);
15. FLUSHING (fluxo): executa-se 2 ou mais exercícios para o mesmo músculo, ou grupo muscular próximos. (Fleck, S. J. 1999);
16. TREINAMENTO DIVIDIDO: consiste em dividir o treino em 2 partes (MMSS em 1 dia e MMII em outro dia). (Guimarães, W. 1997);
18. PAUSA E DESCANSO:
treina-se com cargas altas que possibilitam 2 à 4 rep. dando intervalo
de 15” e então repete-se o processo por 3 ou 4 x aumentando o intervalo
p/ 30, 45, 60”. (Guedes, D. 1997);
19. DROP SET:
consiste em realizar uma série até o esgotamento total, diminuindo o
peso logo em seguida e imediatamente continuada até obter novamente o
esgotamento total. (Guimarães, W. 1997);
20. BLITZ:
dividir os músculos a fim de treinar somente um por dia, aumentando
assim a intensidade do treinamento, podendo até utilizar mais de 1
princípio de treino simultaneamente;
21. ISOTENSÃO: consiste em tensionar o músculo e mante-lo em tensão máxima por 3 a 6”, 3x.(Guimarães, W. 1997);
22. TREINAMENTO EM CICLO:
estruturar o treino para que em um treino anual desenvolver a
hipertrofia e a força e em outra parte do ano desenvolver a resistência
muscular. (Guimarães, W. 1997);
23. INTUIÇÃO:
consiste em treinar um grupamento muscular que se tenha vontade,
considerando o fator psicológico e não fisiológico. (Guedes, D.1997).
Conclusão
Todas
as informações apresentados neste artigo não são uma “receita de bolo
milagrosa” que quando aplicada apresenta um excelente resultado comum,
mas sim parâmetros com amplo embasamento técnico-científico para
podermos elaborar programas e treinar de forma mais consciente,
controlada e respeitando todas as variáveis fisiológicas pertinentes ao
treinamento.
Para conseguirmos atingir grandes resultados em
hipertrofia muscular é extremamente importante levar em consideração,
além da perfeita organização dos treinos com estímulos variados que
quebram a homeostase (variabilidade) utilizando as vias tensional e
metabólica (Fibras I, IIa, IIb e IIx), os fatores genéticos do indivíduo
(somatotipo, herança genética, desenvolvimento ósseo, etc),
nutricionais (consumo x gasto calórico, qualidade alimentar, etc) e os
períodos de recuperação (sono, repouso entre treinos). Sem a perfeita
equalização desses fatores, junto ao conhecimento teórico e prático
profissional, é impossível atingirmos resultados significativos
utilizando qualquer método de treinamento.
Resumindo, devemos
primeiramente conhecer bem as limitações físicas e funcionais de cada
um. Saber que cada ser humano é um ser subjetivo é o princípio de todo
planejamento de um ótimo programa de treinamento. Por isso, o BOM SENSO e
o pleno conhecimento científico, técnico e prático que norteia o tema
treinamento de força é a base para o sucesso.
Texto por: Prof. Esp. Raphael Benassi (CREF 028831-G/RJ).
REFERÊNCIAS:
- DANTAS, E. H. M. A Prática da Preparação Física. 5ed. Rio de Janeiro: Shape, 2003;
- GENTIL, P. Bases Científicas do Treinamento de Hipertrofia. Sprint, 2005;
- GUEDES, D. P. Musculação: estética e saúde feminina. São Paulo: Phorte, 2003;
- GUIMARÃES, W. M. N. Musculação anabolismo total. Liberdade, São Paulo: Phorte, 2002.
- FLECK, S. J; KRAEMER, W. J. Fundamentos do Treinamento de Força Muscular, Ed. ArtMed, 1999;
- Fleck S. J; Kraemer W. J. Fundamentos do treinamento de força muscular. 3ed. Artmed, 2006.
Benassi & Salvador Fisiologia do Exercício e Consultoria